Dor Crônica: Compreendendo, Cuidando e Retomando o Bem-Estar
A dor é uma experiência complexa, que envolve mais do que estímulos físicos — ela também reflete emoções, pensamentos e interpretações individuais. Segundo a Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP), dor é “uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial”. Isso significa que mesmo na ausência de lesão visível, a dor ainda pode ser real e intensa, pois depende de como o cérebro processa os sinais recebidos do corpo.
A dor aguda costuma cumprir um papel protetor: ela nos avisa que algo está errado, como uma lesão ou inflamação, e nos ajuda a evitar agravamentos — por exemplo, ao não apoiar um pé machucado. Esse tipo de dor tende a desaparecer com a recuperação da causa original.
E quando a dor persiste?
Se a dor continua por mais de três meses, ou surge sem uma causa evidente, ela é classificada como dor crônica. Isso ocorre por um processo chamado sensibilização do sistema nervoso, no qual estímulos comuns passam a ser interpretados como dolorosos. Com o tempo, o cérebro se adapta negativamente — um fenômeno conhecido como neuroplasticidade mal adaptativa — perpetuando o ciclo da dor mesmo sem uma lesão ativa.
Imagine um alarme que dispara sem motivo
Pense no sistema nervoso como um alarme de segurança. Em condições normais, ele dispara quando há uma ameaça. Mas com a dor crônica, esse alarme começa a soar sem motivo aparente — como se estivesse desregulado. Essa analogia mostra que a dor crônica tem explicação biológica, pode ser compreendida e merece tratamento adequado.
O cuidado com a dor crônica deve ser individualizado, integrando diferentes áreas da medicina e respeitando o contexto físico, emocional e funcional de cada paciente. Minha abordagem combina recursos da medicina de família, da medicina esportiva e da neurociência para promover alívio, autonomia e qualidade de vida.
Caminhos e Recursos para o Tratamento Personalizado da Dor Crônica:
Educação sobre dor
Explicar o funcionamento da dor crônica reduz o medo, melhora a adesão ao tratamento e empodera o paciente no processo de recuperação.
Movimento com propósito
A dor crônica frequentemente leva ao medo do movimento e à perda de funcionalidade. Orientações médicas que incentivam a retomada gradual de atividades físicas — quando indicadas e conduzidas por profissionais habilitados, como fisioterapeutas e educadores físicos — ajudam na dessensibilização do sistema nervoso e restauram a confiança do paciente no próprio corpo.
Regulação emocional
A dor crônica afeta o humor, o sono e a cognição. Técnicas como respiração, mindfulness, psicoterapia e estratégias cognitivas ajudam a restaurar o bem-estar emocional.
Medicamentos sob medida
O uso de medicamentos é avaliado com cuidado, podendo incluir analgésicos, antidepressivos, anticonvulsivantes e, quando necessário, outras medicações de suporte.
Cannabis medicinal
Em casos específicos, a prescrição de cannabis pode contribuir para o controle da dor e de sintomas associados, como insônia e ansiedade. O uso é realizado com responsabilidade e respaldo científico.
Agulhamento seco
Técnica que utiliza agulhas para estimular pontos-gatilho musculares, sem aplicação de substâncias. É eficaz para aliviar dores miofasciais e melhorar a circulação local.
Neuromodulação periférica
Aplicação de estímulos elétricos em nervos periféricos com o objetivo de modular a dor e reequilibrar o sistema nervoso. Pode ser especialmente útil em casos de dor neuropática ou musculoesquelética persistente.
Reeducação postural e funcionalidade
Avaliação e correção de padrões de movimento e postura ajudam a prevenir sobrecargas, aliviar tensões e melhorar o desempenho nas atividades do dia a dia.
Sono, alimentação e estilo de vida
Sono reparador, nutrição equilibrada, redução do estresse e retomada de atividades prazerosas são pilares fundamentais na recuperação do paciente com dor crônica.